A legislação sobre o assunto
O artigo 128 do Código Penal
brasileiro (que é de 1940) permite o aborto quando há risco de vida para
a mãe e quando a gravidez resulta de estupro. Porém, apenas sete
hospitais no pais faziam o aborto legal. Esse ano, a Comissão de
Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou a
obrigatoriedade de o SUS (Sistema Único de Saúde) realizar o aborto nos
termos da lei. O projeto, porém, permite ao médico (não ao hospital)
recusar-se a fazer o aborto, por razão de consciência – um
reconhecimento de que o assunto é polêmico e que envolve mais que
procedimentos médicos mecânicos. Por exemplo, o ministro da Saúde,
Carlos Albuquerque, disse ser contrário à lei e comparou aborto a um
assassinato. Além disto, médicos podem ter uma resistência natural, pela
própria formação deles (obrigação de lutar pela vida). "O juiz que
autoriza o aborto é co-autor do crime. Isso fere o direito à vida",
disse o desembargador José Geraldo Fonseca, do Tribunal de Justiça de
São Paulo, em entrevista ao jornal Estado de São Paulo (22/09/97).
Segundo ele, o artigo 128 do Código Penal não autoriza o aborto nesses
casos, mas apenas não prevê pena para quem o pratica. No momento,
existem projetos de ampliar a lei, garantindo o aborto também no caso de
malformação do feto, com pouca possibilidade de vida após o parto.
O ensino bíblico
O
assunto é particularmente agudo para os cristãos comprometidos com a
Palavra de Deus. É verdade que não há um preceito legal na Bíblia
proibindo diretamente o aborto, como "Não abortarás". Mas a razão é
clara. Era tão inconcebível que uma mulher israelita desejasse um aborto
que não havia necessidade de proibi-lo explicitamente na lei de Moisés.
Crianças era consideradas como um presente ou herança de Deus (Gn 33.5;
Sl 113.9; 127.3). Era Deus quem abria a madre e permitia a gravidez (Gn
29.33; 30.22; 1 Sm. 1.19-20). Não ter filhos era considerado uma
maldição, já que o nome de família do marido não poderia ser perpetuado
(Dt 25.6; Rt 4.5). O aborto era algo tão contrário à mentalidade
israelita que bastava um mandamento genérico, "Não matarás" (Êx 20.13).
Mas os tempos mudaram. A sociedade ocidental moderna vê filhos como
empecilho à concretização do sonho de realização pessoal do casal, da
mulher em especial, de ter uma boa posição financeira, de aproveitar a
vida, de ter lazer, e de trabalhar. A Igreja, entretanto, deve guiar-se
pela Palavra de Deus, e não pela ética da sociedade onde está inserida.
A humanidade do feto
Há
dois pontos cruciais em torno dos quais gira as questões éticas e
morais relacionadas com o aborto provocado. O primeiro é quanto à humanidade do feto.
Esse ponto tem a ver com a resposta à pergunta: quando é que, no
processo de concepção, gestação e nascimento, o embrião se torna um ser
humano, uma pessoa, adquirindo assim o direito à vida? Muitos que são a
favor do aborto argumentam que o embrião (e depois o feto), só se torna
um ser humano após determinado período de gestação, antes do qual
abortar não seria assassinato. Por exemplo, o aborto é permitido na
Inglaterra até 7 meses de gestação. Outros são mais radicais. Em 1973 a
Suprema Corte dos Estados Unidos passou uma lei permitindo o aborto,
argumentando que uma criança não nascida não é uma pessoa no sentido
pleno do termo, e portanto, não tem direito constitucional à vida,
liberdade e propriedades. Entretanto, muitos biólogos, geneticistas e
médicos concordam que a vida biológica inicia-se desde a concepção. As
Escrituras confirmam este conceito ensinando que Deus considera sagrada
vida de crianças não nascidas. Veja, por exemplo, Êx 4.11; 21.21-25; Jó
10.8-12; Sl 139.13-16; Jr. 1.5; Mt 1.18; e Lc 1.39-44. Apesar de algumas
dessas passagens terem pontos de difícil interpretação, não é difícil
de ver que a Bíblia ensina que o corpo, a vida e as faculdades morais do
homem se originam simultaneamente na concepção.
Os Pais da
Igreja, que vieram logo após os apóstolos, reconheceram esta verdade,
como aparece claramente nos escritos de Tertuliano, Jerônimo, Agostinho,
Clemente de Alexandria e outros. No Império Romano pagão, o aborto era
praticado livremente, mas os cristãos se posicionaram contra a prática.
Em 314 o concílio de Ancira (moderna Ankara) decretou que deveriam ser
excluídos da ceia do Senhor durante 10 anos todos os que procurassem
provocar o aborto ou fizesse drogas para provocá-lo. Anteriormente, o
sínodo de Elvira (305-306) havia excluído até a morte os que praticassem
tais coisas. Assim, a evidência biológica e bíblica é que crianças não
nascidas são seres humanos, são pessoas, e que matá-las é assassinato.
A santidade da vida
O segundo ponto tem a ver com a santidade da vida.
Ainda que as crianças fossem reconhecidas como seres humanos, como
pessoas, antes de nascer, ainda assim suas vidas estariam ameaçadas pelo
aborto. Vivemos em uma sociedade que perdeu o conceito da santidade da
vida. O conceito bíblico de que o homem é uma criatura especial, feito à
imagem de Deus, diferente de todas as demais formas de vida, e que
possui uma alma imortal, tem sido substituído pelo conceito humanista do
evolucionismo, que vê o homem simplesmente como uma espécie a mais, o Homo sapiens,
sem nada que realmente o faça distinto das demais espécies. A vida
humana perdeu seu valor. O direito à continuar existindo não é mais
determinado pelo alto valor que se dava ao homem por ser feito à imagem
de Deus, mas por fatores financeiros, sociológicos e de conveniência
pessoal, geralmente utilitaristas e egoístas. Em São Paulo, por exemplo,
um médico declarou "Faço aborto com o mesmo respeito com que faço uma
cesárea. É um procedimento tão ético como uma cauterização". E
perguntado se faria aborto em sua filha, respondeu: "Faria, se ela
considerasse a gravidez inoportuna por algum motivo. Eu mesmo já fiz
sete abortos de namoradas minhas que não podiam sustentar a gravidez" (A Folha de São Paulo, 29 de agosto de 1997).
Conclusão
Esses
pontos devem ser encarados por todos os cristãos. Evidentemente,
existem situações complexas e difíceis, como no caso da gravidez de
risco e do estupro. Meu ponto é que as soluções sempre devem ser a favor
da vida. C. Everett Koop, ex-cirurgião geral dos Estados Unidos,
escreveu: "Nos meus 36 anos de cirurgia pediátrica, nunca vi um caso em
que o aborto fosse a única saída para que a mãe sobrevivesse". Sua
prática nestes casos raros era provocar o nascimento prematuro da
criança e dar todas as condições para sua sobrevivência. Ao mesmo tempo,
é preciso que a Igreja se compadeça e auxilie os cristãos que se vêem
diante deste terrível dilema. Condenação não irá substituir orientação,
apoio e acompanhamento. A dor, a revolta e o sofrimento de quem foi
estuprada não se resolverá matando o ser humano concebido em seu ventre.
Por outro lado, a Igreja não pode simplesmente abandonar à sua sorte as
estupradas grávidas que resolvem ter a criança. É preciso apoio,
acompanhamento e orientação.
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